Todo espaço escolar caracteriza um ambiente sócio-moral, alicerçado pelas regras, relações, condutas, códigos sociais, crenças e relação entre participantes do grupo, dentre outros fatores. Defendemos, aqui, um ambiente sócio-moral construtivista, em que se promova caminhos para a autonomia moral e intelectual. Acreditamos em uma imagem de criança vívida, potente, capaz, intelectualmente ávida e curiosa, que se manifesta em suas centenas de linguagens e que, como já dissemos, merece genuinamente ser ouvida.
Segundo Piaget (1932/1965), a criança passa por uma fase pré-moral, caracterizada pela anomia (o prefixo A indica ausência, e NOMIA, regra, lei), coincidindo com o egocentrismo infantil e que vai até aproximadamente 4 anos, quando, centrada em si, não consegue colocar-se na perspectiva alheia. Aos poucos, a criança ingressa na moral heterônoma à medida que se desenvolve e caminha gradualmente para a fase autônoma.
Contudo, dependendo do tipo de relação que este professor estabelece com a criança, ela pode ser favorecida ou não na construção desta autonomia. Por exemplo, os ambiente nos quais a criança não tem papel ativo, em que se oferecem metodologias prontas, sem qualquer possibilidade de argumentação, criatividade ou autoria, promovem a passividade e reforçam a heteronomia. Outra situação crítica é a conduta do professor pela utilização de recompensas e punições como forma de controle comportamental e representa outro modo de distanciar o desenvolvimento de autonomia, já que as crianças passam a agir coagidas, por interesse, temor ou regulação externa. O ambiente da Educação Infantil deve ser livre de pressões, requer leveza, alegria, veracidade e criatividade.
Piaget (1932/1965) afirma que essas fases (anomia e heteronomia) se sucedem e se inter-relacionam sem constituir estágios propriamente fixos ditos, o que se justifica por encontrarmos inclusive adolescentes ou adultos que apresentam dificuldades para tomar decisões autônomas, por exemplo, demonstrando fortes traços heterônomos, possivelmente tendo sido pouco encorajados em relação ao desenvolvimento da autonomia moral e intelectual.
HETERONOMIA, seguindo a mesma lógica, significa, portanto, que a lei vem do exterior, do outro. Já a AUTONOMIA refere-se à capacidade de governar a si mesmo. Contudo, se não proporcionamos momentos voltados às decisões, escolhas, manifestações de opinião, criticidade e criatividade, como podemos desejar alunos autônomos? Muitas vezes o discurso se distancia de uma prática arcaica e conservadora. E as vozes dos pequenos se calam. E cala-se a infância e o futuro em transformação.
Na moralidade heretônoma, os deveres são vistos como externos, impostos coercitivamente A responsabilidade pelos atos é avaliada de acordo com as consequências objetivas das ações e não pelas intenções. O indivíduo obedece às normas por medo da punição. Na ausência da autoridade ocorre a desordem, a indisciplina. Lembramos, porém, que a autoridade deve ser legitimada pelas crianças. Ser autoridade requer conquistar legítimo respeito. Ser autoritário significa, ao contrário, impor ordem de modo coercitivo, não sendo autoridade legitimada, pois só se obedece por temor.
Outro aspecto importante sobre os ambientes sócio-morais é que as salas ativas cognitivamente, reflexivas e colaborativas em geral não são quietas, tampouco apáticas. Afinal, desejamos alunos passivos? Ou alunos que têm repertório, sabem argumentar, que estão aprendendo a negociar seus direitos e deveres, conhecendo o valor e o princípio que regem determinada regra?
O ambiente sócio-moral construtivista encoraja a moralidade autônoma, em que o indivíduo adquire a consciência moral. Os deveres são cumpridos com consciência de sua necessidade e significação. Possui princípios éticos e morais. Na ausência da autoridade continua o mesmo. É responsável, auto-disciplinado e justo. A responsabilidade pelos atos é proporcional à intenção e não apenas pelas consequências do ato. Obviamente, na Educação Infantil, isso se contrói gradativamente, com as primeiras assembleias, cartazes de combinados, avaliações do dia, jogos dos sentimentos etc.
Enfim, o processo educativo deve conduzir a criança a sair de seu egocentrismo, natural nos primeiros anos, caracterizado pela anomia, e entrar gradualmente na heteronomia, encaminhando-se naturalmente para a sua própria autonomia moral e intelectual que é o objetivo final da educação moral. E você, leitor, já parou para pensar em que ambiente sócio-moral está atuando?