A escola, por sua organização autoritária ou democrática, pode transmitir ou sugerir implicitamente valores e crenças pedagógicas. Na esfera das relações interpessoais, a criança aprende a pensar sobre si como detentora de determinadas características quando comparada aos outros. As relações interpessoais da criança são o cenário para a elaboração da imagem favorável (ou não) de si mesma, dos outros e do conhecimento de mundo. Dependendo da origem da atmosfera sociomoral geral da existência de uma criança, ela compreende a maneira pela qual o universo dos humanos é seguro ou inseguro, amável ou hostil, coercivo ou cooperativo, satisfatório ou insatisfatório (RHETA DEVRIES E BETTY ZAN, 1998, p.123).
Nesse sentido, mais uma vez, ressaltamos não apenas o calor da atmosfera ambiental do ambiente escolar, mas a qualidade das relações estabelecidas pelo educador, e seu papel de formador, sendo necessário que esteja amplamente preparado para atuar, reconhecendo suas fragilidades e êxitos. Nenhum profissional é perfeito em suas ações didáticas, mas refletir sobre sua conduta percebendo valores implicitamente apresentados às crianças pode ajudar e muito em sua formação. Para que percebemos o impacto do ambiente democrático ou autoritário e sua atmosfera na vida das crianças, recorreremos a alguns teóricos que melhor elucidarão a discussão.
Segundo estudos de La Taille (2002), chamamos de senso moral o desejo de participar de um universo moral, seguido da compreensão paulatina do que são deveres, fase que ocorre por volta dos quatro anos de idade, no denominado despertar do senso moral, que reúne sentimentos importantes para o desenvolvimento moral. Esse sentimento, para alguns autores, é abordado como fator decisivo para a obediência às regras morais por crianças antes dos sete anos, que são movidas sobretudo pelo medo das punições e medo de perder o amor e a proteção dos pais, para elas vital.
Voltando à Rheta DeVries e Betty Zan (1995), que compararam o comportamento de crianças que viveram em ambientes escolares mais autoritários a outras que integraram um ambiente escolar fundamentado em princípios da teoria construtivista, ou seja, um ambiente cooperativo, estas últimas apresentaram um avanço significativo no desenvolvimento sociomoral, resolvendo seus conflitos de maneira mais adequada e justa e estabelecendo interações mais cooperativas com os pares.
Nesse sentido, Piaget (1932/1965) descreveu tipos de moralidade, correspondentes aos tipos de relacionamento estabelecidos entre crianças e adultos. O primeiro, comum em ambientes autoritários, é a moralidade da obediência, ou moralidade heterônoma, em que o indivíduo segue regras morais estabelecidas por outros, por obediência a uma autoridade que tem poder coercivo (vantagens a serem obtidas pessoalmente).
O segundo, presente em ambientes democráticos, é a moralidade AUTÔNOMA, em que o indivíduo segue princípios autorreguladores e autoconstruídos, com regras que têm um sentido de necessidade para o indivíduo, uma vez que na autonomia a obediência se dá pela compreensão e concordância com a validade universal de determinada regra.
Assim, por que será que tantos educadores dizem que a punição, ou seja, ação e consequência punitiva, “funciona”? Seria o estudo de relações interpessoais e moralidade um caminho para educar com significado e consciência autônoma? A referida hipótese baseia-se em estudos de autores como Rheta DeVries e Betty Zan (1995), que comparam ambientes autoritários com aqueles em que os princípios cooperativos são priorizados, sendo que nestes últimos, as autoras verificam uma possibilidade maior de resolução de conflitos e interações mais cooperativas entre pares.
Sendo assim, é muito importante que tenhamos em mente novamente a imagem de criança que queremos formar: socialmente ativa, crítica, argumentativa, moral e intelectualmente autônoma ou, ao contrário, detentora de conhecimentos vazios, não articulados a seu poder social.